1 de dezembro de 2023

 

ANTÓNIO PEIXINHO EM MINI 

A carreira de António Peixinho foi recheada de sucessos e teve a oportunidade de conduzir automóveis de grande gabarito. Mas não há certamente algum piloto dos anos 60 que não tenha competido ao volante de um Cooper S e Peixinho não foi excepção.

 Em 1963 ia realizar-se a primeira edição do “Rali a las Rias Bajas” e Manuel Lopes Gião, já na altura a maior referência nacional na condução dos Cooper`s, convenceu Peixinho a acompanhá-lo como navegador. O organizador era o amigo “Manolo” Pestana e a prova, adivinhava-se, iria ser “uma grande festa”. No entanto, quando faziam as verificações documentais, viram que Gião não possuía licença desportiva internacional, por isso não podia realizar a prova … a não ser que fosse como co-piloto!

E foi assim que Peixinho assumiu o comando do Austin Cooper 997, aproveitando a maneabilidade do carro para logo de início vencer o slalom que abria a prova. Depois bastou à dupla lusitana aproveitar a competitividade do carro, manter aquela posição cimeira, e no final, Peixinho e Gião foram coroados como vencedores da prova! E a festa ia apenas agora começar, pois na distribuição de prémios no Aero Club conheceram três simpáticas espanholas que os levaram para a movida nocturna galega e a noite dos portugueses terminou … com um capotamento do Mini e os seus tripulantes na cadeia! O que lhes valeu foi sempre boa disposição de Peixinho e a pronta ajuda de Pestana, que finalmente lhes evitou uma noite no “calabozo” de Vigo.

António Peixinho foi a partir desta altura solidificando a sua carreira, conduziu o Ferrari LM de Pierre de Siebenthal, o Ferrari GTO do Marquês de Montaigu, os Ford Cortina Lotus e Lotus Cortina quase oficiais em 1966 e 67, e em Outubro de 1968 resolve adquirir o Morris Cooper S do Eng. Burnay Bastos e participar numa prova que estava ainda na sua segunda edição, mas, sob a batuta de César Torres, prometia desde já ser em breve a grande prova portuguesa no panorama europeu de Ralis, o Rali TAP.

O Rali revelou-se uma prova duríssima, e contou com a presença de elevado número de estrangeiros, mais de metade dos presentes, sendo na sua maioria amadores britânicos.

Entre os presentes, salientem-se Paddy Hopkirk num Austin Cooper S oficial (LBL 606D), Tony Fall e Alcide Paganelli em Lancia Fulvia HF, Jean Pierre Nicolas em Renault e o campeão francês Robert Bouchet (Porsche 911). Os melhores portugueses estavam também todos presentes, como Francisco Romãozinho, Américo Nunes, Ernesto Neves, José Lampreia, Luís Netto, Burnay Bastos, Fernando Baptista entre muitos outros.

O carro de Peixinho, o Morris Cooper S “FE-69-92” era o ex. carro do Eng. Burnay Bastos e que havia sido adquirido nesta altura, sendo preparado na Mercauto – Serviço Morris (Lisboa) e apresentava-se como um autêntico “full grupo 2” com cerca de 118 cavalos às 7.600 rpm.

A grande dureza da prova, foi-se refletindo no número de concorrentes que se mantinham dentro das penalizações admitidas, e no final das três etapas, que percorriam grande parte do país de dia e de noite, e depois de realizadas as provas complementares na pista de Jarama, Estádio de Alvalade, Proença-a-Nova, Aguiar da Beira, Estádio do Lima e Serra da Lousã, apenas 22 duplas lograram atingir o Estoril, tendo apenas 13 ficado classificadas.

Venceu a dupla da Lancia, constituída por dois homens ex. BMC, Tony Fall/Ron Crellin, na segunda posição ficou o Cooper S oficial de Paddy Hopkirk/Tony Nash e em terceiro lugar a surpreendente a melhor dupla nacional … António Peixinho e “Jocames”!

Mais um excelente resultado do piloto de Aveiro, que afinal conduzia bem os pequenos ingleses de tração dianteira!

Em Janeiro de 1969 disputou-se a 38ª edição do Rali de Monte Carlo, sendo de realçar a presença de uma equipa portuguesa, o que já não acontecia desde 1962.

Certamente que a dupla António Peixinho - Burnay Bastos, no mesmo Morris Cooper S, não almejava atingir lugares cimeiros da classificação, mas tinha toda a confiança em atingir o final da prova, na altura uma autêntica vitória para qualquer privado que se atrevesse a disputar a dura prova monegasca.

Partiram quase 200 concorrentes de 8 cidades europeias, para a um percurso de Concentração de mais de 3.000 km que se dizia ser “uma festa para os amadores e uma maçada para os profissionais”. Depois, havia que disputar o percurso Comum, (156 concorrentes) de cerca de 1.500 km, esse sim difícil para os amadores, que corriam grandes riscos de não aguentar as adversidades e passar sem graves penalizações.

De Lisboa partiram 15 equipas, sendo Munari (Lancia), Vinatier (Alpine) e Andruet (Alpine) os nomes mais sonantes que saíram da nossa capital a partir das 22.26 horas do dia 17 de Janeiro.

As equipas oficiais apostavam forte na prova: a Porsche, vencedora no ano passado com Vic Elford e grande favorita a nova vitória, alinhava o mesmo Elford, os franceses Larrousse e Chasseuil, o finlandês Pauli Toivonen (pai de Henri Toivonen), e o sueco Waldegaard, todos em 911 S; A Alpine-Renault perdeu os préstimos de Gérard Larrousse, mas apresentava Andruet, Nicolas e Vinatier, ao volante das “berlinetas” 1300 S; A Lancia, aproveitou os “desempregados” Tony Fall e Rauno Aaltonen (ex. BMC) e juntou-lhes Munari e Kallstrom, este num protótipo de 1600 cc. Aliás, a autorização da participação de protótipos (que faziam o chamado Rali do Mediterrâneo) valeu ao Monte de 69 a saída do Campeonato Europeu da modalidade. De notar também as presenças das equipas oficiais da Ford e da BMW. Entre os homens da oval azul, equipados com Escort Twin Cam, salientem-se os nomes de Jean François Piot, Ove Andersson e Timo Makinen (também ex. BMC); entre os carros alemães havia dois dos novos 2002 Ti para Timo Makinen (outro ex. BMC) e Ake Andersson. Saliente-se que os carros mais potentes eram os Porsche e os BMW, com cerca de 180 cavalos.

Ao carro português, estava prometido à equipa nacional o apoio da Dunlop, que haveria de fornecer aos portugueses os necessários pneus de pregos para que pudessem vencer as adversidades do percurso comum, disputado debaixo de forte neve e gelo.

Infelizmente, a dupla nacional, que andava a meio da tabela classificativa, teve que abandonar após a quinta classificativa, após uma penalização de 22 minutos … devido a não ter pneus! Na quarta classificativa a dupla nacional despistou-se por duas vezes já que não tinha os pneumáticos apropriados. A Dunlop não cumpriu o prometido, não levando pneus para as jantes de 5,5 polegadas da dupla nacional!

A presença de privados era, nesta altura, quase como uma aventura, já que não podiam competir com as estruturas das equipas oficiais numa prova tão longa e dura, disputada dia e noite e em que quase não se podia descansar. Como dizia António Peixinho, os portugueses pareciam quase como “duas costureirinhas no meio dos mestres da costura”…

A vitória final haveria de ser decidida entre os homens da Porsche, com a vitória final a sorrir à dupla Waldegaard-Helmer, seguida de Larrousse e Perramond, também em 911 S. Na 3ª posição ficou o melhor Alpine, o de Jean Vinatier. Realcem-se os desempenho do jovem Jean Luc Therier em Renault 8 Gordini, que foi 5º e venceu entre os Turismos de Série e de Pat Moss (Lancia), que foi 6ª classificada e venceu a Taça das Senhoras. No “Rallye do Mediterrâneo” venceu a dupla Kallstrom - Haggbom em Lancia 1.6, que aliás seria a 2ª classificada numa hipotética classificação “à geral” …

Pouco tempo depois (29 de Março) Peixinho levaria o Cooper S “FE-69-92” até Angola, dando espectáculo em Moçâmedes (Namibe) ao vencer de forma brilhante no III Circuito das Festas do Mar.

A Taça Câmara Municipal de Moçâmedes teve a presença de 20 concorrentes. António Peixinho, que não treinou, arrancou da última fila, mas na primeira passagem pela meta era já terceiro, passando a comandar a prova na segunda volta. Alguns dos maiores adversários de Peixinho vão tendo problemas, como Carlos Conde (Mini Cooper S), Belmiro Vieira (BMW 2002 Ti), Carlos Cristão (Alfa Romeo) e abandonam a prova e a luta fica circunscrita a Peixinho e a António Lacerda em Ford Cortina Lotus. Saliente-se que Peixinho foi chamado por duas vezes à sua boxe para fixar o escape, que arrastava no chão, e ter parado a 14 voltas do fim para reabastecer, recuperou mas mesmo assim o comando e terminou com 10 segundos de vantagem em relação a Lacerda. No terceiro posto ficou Emílio Marta, no Lotus Cortina registo “167 RUR”, um antigo carro da equipa oficial da Lotus, em quarto Francisco Barbosa em BMW e no quinto posto o continental Mário Santinho em Morris Cooper S.

No final da prova o Morris foi vendido em Moçâmedes ao “Teles da farmácia”, que tentou com ele realizar uma prova em Sá da Bandeira, mas que aparentemente não seria muito dotado para a condução … e o carro ficou por Angola, onde terá terminado a sua “vida” abandonado num armazém.

António Peixinho, por seu lado, nas quatro provas disputadas em Mini, obteve duas vitórias, foi noutra o melhor português numa prova internacional e participou no Rali do Monte Carlo.

Não se pode dizer que tenha sido mau!