1 de dezembro de 2023

 

A CURVA DO CASTELO EM IMAGENS

Texto: José Mota Freitas 

 

Já passaram vinte anos desde que se disputaram pela última vez corridas em Vila do Conde. Nesses dias juntavam-se facilmente vários milhares de espectadores ao longo dos 2700 m do traçado. Para muitos, o local preferido para se assistir ás provas era a Curva do Castelo…

1 – VISTA PANORÂMICA DO CASTELO (1951)

Esta foto, da autoria do fotógrafo vilacondense Carlos Adriano e pertencente ao espólio da Câmara Municipal de Vila do Conde, mostra a cuidada indumentária do público presente no castelo e o modo como eram facilmente estacionados os carros na recta da meta. Pode também ver-se como era a pista na altura e reparar que não havia casas na zona do castelo. Lembre-se que a pista de Vila do Conde foi construída em 1951 PROPOSITADAMENTE, pelo presidente da Câmara Bento de Jesus Amorim, para aí se disputarem corridas de automóveis, sendo portanto na época quase um autódromo. Todos os que construíram ou compraram casas na zona do Castelo ou da recta da meta fizeram-no APÓS o nascimento da pista, sendo como tal difícil de aceitar as críticas de que “as corridas em Vila do Conde prejudicavam a vida dos residentes”...

2 – COMO “COMER” UM PORSCHE EM VILA DO CONDE (1968)

Numa tertúlia do Porto, alguém chegou e disse “vou comer um Porsche em Vila do Conde”. João Paulo Sotto Mayor (JPS), já presente na edição de VC 66, percebeu que o repto era para si e decidiu inscrever-se, fazendo questão em ter o nº 69! Estavam presentes 5 MGB de 5 amigos de JPS: o de Alexandre Guimarães e mais quatro, entregues a pilotos com os sinistros nomes de “Ed Crow”, “Jolly”, “Handy”, e “Capesi”: eram estes que queriam “comer” o Porsche! Durante a prova JPS esteve sempre em luta “roda com roda” com “Ed Crow” (nome verdadeiro: Nuno Carneiro), até que na última volta, o piloto do MGB faz uma ultrapassagem “suicida” a JPS e fica na frente do Porsche 356. Era o delírio na boxe dos homens dos MGB! De facto, tinham “comido” um Porsche em Vila do Conde…

 3 – “ALTER” (1969)

Depois de tirar o curso de Engenharia Automóvel em Inglaterra, Domingos Sá Nogueira trás o seu Mini para Portugal e resolve fazer companhia ao seu irmão Bernardo nas corridas de Turismo. Inscreve-se então com o nome de “Alter”. No ano seguinte, em 1970, Domingos será o 2º na prova de Turismo atrás do inalcançável Ernesto Neves (Ford Escort TC) e em 1973, na sua última participação em VC, consegue um novo 2º posto na pista do Ave, desta vez ao volante do Alfa GTA 1300 da Mocar a atrás do (também inalcançável…) Escort RS de Jorge Ribeiro de Sousa. Domingos, seria nesse ano o Campeão Nacional de Velocidade em Grupo 2.

 4 – VALENTIM PINTO (1972)

Muito já não se lembrarão, mas nos anos 70 as boxes de Vila do Conde ficavam do lado direito e a curva do castelo tinha uma escapatória em terra onde muitos pilotos davam espontaneamente espectáculo para os milhares de espectadores que então se juntavam nas bancadas e no peão. Em 1972, na corrida de Grupo 1 decerto muitos se recordam do Mini 1275 GT de Valentim Pinto, que em todas as passagens pelo castelo fazia uma espectacular incursão pela terra. No entanto, Valentim não chegaria ao fim da prova, depois de ter conseguido apenas o 22º tempo nos treinos…

5 – O ESPECTÁCULO JORGE SANTOS EM TEMPO DE P.R.E.C. (1975)

A edição de 1975 de VC foi decerto a mais problemática de sempre em relação ao comportamento do público: em tempo de P.R.E.C., os espectadores invadiram a pista e chegaram a colocar cadeiras na borda do asfalto e a tapar a passagem nos “esses” do Jardim. Só a calma e a experiência do Eng.º Carlos Fonseca conseguiram resolver a situação a contento. Mas a grande moldura humana presente então em VC não esquece decerto a performance de Jorge Santos, piloto vindo recentemente de Angola, que deu um espectáculo deslumbrante no castelo, ao curvar volta após volta com a roda traseira no ar, ao volante do seu BMW 2002 cor de laranja…

6 – OS INICIADOS ANÓNIMOS (1975)

Uma das âncoras de Vila do Conde dos anos 70 e 80 era sem dúvida o grande número de pilotos emigrantes, que vinham a Portugal no Verão e corriam em VC com o seu carro “tipo azeiteiro” de matrícula francesa e também os muitos jovens e inexperientes iniciados que apareciam em VC para competir por puro prazer, ao volante do seu carro de dia-a-dia ou pior ainda, com o carro roubado à mãe sem ela saber… Anónimos como Jorge de Almeida, um iniciado de 1975, visto aqui com o seu simples Peugeot 304 aparentemente normal e apenas equipado com o “roll-bar” obrigatório, ajudaram a criar a mística e a manter anualmente o interesse à
volta das corridas em Vila do Conde.

7 – GRUPO 1 ATÉ 1300 (1976)

A grande massa humana que assistiu em Agosto de 1976 à 20ª edição do Circuito de Vila do Conde decerto que vibrou com a luta Simca-Datsun na corrida de Grupo 1 até 1300 cc. Do lado dos Datsun estavam Fernando Faria, Oswaldo Oliveira, Jorge Santos Silva, João Cerqueira, José Henriques e José Tigre; do “Team Simca” faziam parte Edgar Fortes, Carlos Barata, Vítor Pais, António Bastos e Vasco Ferreira e João Calha da Fonseca. Apesar do esforço dos homens dos 1200 GX a vitória iria parar às mãos do Simca de Edgar Fortes. Na foto reconhecem-se Oswaldo Oliveira (Datsun nº 190), um excelente piloto, infelizmente já desaparecido e Vasco Trigo Ferreira no Simca Rallye 2 (HN-23-62).

8 – GRUPOS 2 A 5 (1976)

Uma imagem bonita de VC 76. O nevoeiro abate-se sobre o castelo na volta de aquecimento da corrida de Grupos 2 a 5. Era a época em que os Grupo 5 baratos e artesanais enchiam as grelhas. Estavam inscritos 29 concorrentes e como a pista só comportava 24 carros tiveram que ficar 5 de fora. Preparados para a luta, podem ver-se o Escort RS de António José Oliveira, o Ford Capri do piloto-preparador Serafim Martins, o Lotus Europa de João Vasco e por dentro, meio encoberto, o Porsche Carrera RSR de Robert Giannone, que iria vencer em dia de estreia após uma excelente luta com o homem do Escort. Estávamos em 1976, eram outros tempos, mas reparem na bizarra posição do “cameraman” no lado direito do Triumph Dolomite …

9 – JORGE TENREIRO E PEQUEPE (1979)

Entre 1975 e 81 as corridas de Grupo 1 em Vila do Conde, foram dominadas quase sempre pelos Opel Commodore GS/E, por vezes com a réplica dos Triumph Dolomite Sprint, Ford Capri 3000 e Ford Escort RS 2000. Juntamente com Pêquêpê, Rufino Fontes, Joaquim Moutinho e muitos outros, António Barros foi um dos melhores representantes da Opel, tendo mesmo ficado para sempre com o melhor tempo feito em Vila do Conde com um Commodore: 1.13.83, realizados em 1979. Neste momento em que Barros está internado e lutando pela sua vida, nada melhor do que esta pequena homenagem a um dos maiores pilotos portugueses de sempre. Força Tony!

10 – O FORD ESCORT FVC DE CARLOS MARTA (1980)

Uma bela imagem da curva do castelo, com o Rio Ave e a Vila de Árvore como pano de fundo. Pode ver-se o Ford Escort FVC de Carlos Marta, um dos automóveis mais fotografados na época devido ao seu ar agressivo, bem perto do aspecto dos Protótipos “Silhueta” internacionais. O carro do filho de Emílio Marta estava equipado com um motor Ford FVC 1800 provavelmente trazido de Angola, e que permitia ao piloto, enquanto o carro aguentava, lutar pelas primeiras posições das provas de Iniciados. Marta utilizou este carro em Vila do Conde, entre 1980 e 1982. Atrás de Marta, vem o Mini 1275 GT de Pinheiro Borges, o mesmo que no ano seguinte seria desclassificado por ter 1400 cc…

11 – VELOSO AMARAL – IMP (1981)

Serve esta foto (que poderia perfeitamente ser actual), por um lado para homenagear um dos mais antigos e também mais simpáticos pilotos ainda em actividade, Manuel Veloso Amaral, mostrando esta imagem do seu IMP em 1981 em luta pontual com o futuro campeão nacional de B1 Alberto Freitas (outro Campeão ainda em actividade), mas também para lembrar que alguns anos antes, em 1975, Veloso Amaral deu um grande espectáculo no castelo, fazendo incursões à terra da escapatória em slide prolongado em todas as passagens, com o seu Renault 12 TS amarelo.

12 – TROFÉU CLEMENTE RIBEIRO DA SILVA (1982)



Os automóveis de Grupo 5 foram banidos das provas do nacional de velocidade em 1982, pois a federação resolveu seguir à risca os regulamentos internacionais, adoptando por isso os novos grupos A e B. Logo se levantaram muitas vozes contra, apelando para que então se fizesse um troféu para os “muitos” carros de Grupo 5 existentes. Nasceu pois o “Troféu Clemente Ribeiro da Silva”, que teve em Vila do Conde apenas 12 participantes, o mínimo para que a prova se realizasse. O Troféu acabou rapidamente, pois de facto os Grupos 5 artesanais estavam já velhos e incapazes. Para descanso de Clemente, que de facto não merecia uma
homenagem tão fraca…

13 – LANCIA RALLY 037 (1984)

A partir de 1982 as provas de Agrupamento B2 (acima de 1300 cc) passam a ser disputadas pelos automóveis de Grupo B, o que se revelou uma péssima estratégia pois havia muito poucas opções válidas disponíveis no mercado. A maioria dos carros presentes era antigos Grupos 5 reconvertidos (como os Porsche 911 SC), ou carros de Rali que faziam também incursões nas provas de Velocidade (como os Escort RS 1800). Em 83 apareceram em Portugal os 2 BMW M1 de Daniel Vidal (ex. Walter Brun) e António Taveira (ex. Leopold Von Bayern), mas para 84 a grande surpresa seria sem dúvida António Rodrigues, que com um Lancia Rally 037 de Grupo B (um ex. muleto de fábrica), surpreendeu tudo e todos com as performances que apresentou nas provas no nacional de velocidade (especialmente nas Rampas) e que culminariam com o Título absoluto no final do ano!

14 – OS TAXI DE ESTOCOLMO (1985)

Para muita gente (incluindo-me a mim próprio) o melhor Nacional de Velocidade de sempre em Portugal teve lugar na década de 80 (82-90) com as corridas de Turismo Grupo A. Nessa altura podíamos ver automóveis como os Alfa Romeo GTV6 2500 e 75 Turbo, Ford Sierra RS 500, BMW 528i, Ford Capri 3000, BMW M3, VW Golf GTi, BMW 635 CSi e Volvo 240 Turbo. E os nossos melhores pilotos da época felizmente não corriam em Espanha, corriam cá! Ni Amorim, Rufino Fontes, António Rodrigues, Sidónio Cabanelas, Carlos Rodrigues, Pêquêpê, Jorge Petiz, Christian Melville, etc. Preparados por Eggenberger, e vindos das mãos de pilotos como Gianfranco Brancatelli e Anders Olofsson, os Volvo 240 Turbo eram conhecidos como os “Táxis de Estocolmo”, devido à sua envergadura pouco comum em provas de automóveis. Em Portugal foram conduzidos por Artur Mendes e António Rodrigues, aparecendo este último na foto tirada em VC 85, o seu ano de estreia.

15 – OS COMISSÁRIOS DO CASTELO

O público presente ano após ano nas bancadas do castelo decerto se lembra de algumas das suas caras e por isso nada melhor do que juntar a esta evocação também uma foto do pessoal que trabalhava anualmente no Posto do castelo. Os comissários e agentes de segurança eram habitualmente vítimas da chacota e insultos fáceis por parte do público da bancada. Era assim que toda a gente se ria e fazia parte da festa, por isso ninguém se importava, nem os comissários! Para ficar para a posteridade, a equipa do Castelo tirou esta foto em 1988. Em 3ª da esquerda em cima é o Chefe de Posto, Germano Canossa. Em baixo o 2º da esquerda é o José Ferreira (mais conhecido como Zé Pirelli) o Comissário Chefe de Segurança. Muitos dos que aparecem na foto estão ainda hoje activos e ligados à organização de provas de automóveis. Ah, o autor destas linhas está no meio, de cócoras, e por trás vê-se a enfermeira Goretti que lhe está a fazer umas “brincadeiras” com as mãos… bons tempos!

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As fotos utilizadas nesta publicação foram cedidas por: Arquivo Municipal de Vila do Conde (1), Domingos Sá Nogueira (3), Francisco Vieira e Brito (13), Fórum Auto Hoje – Clássicos (7, 8), Rui Sanhudo (12), JMF (15), João Paulo Sotto Mayor (2, 4, 6), J. Loureiro (10, 11), e retiradas de Motor (5) e Autosport (9, 14).